20060929

Gosto, desgosto, carta...

Nos tempos em que sem saber fui menina, aprendíamos um pouco de tudo, até a bordar e a costurar. Lembro-me da salinha dos bordados e dos seus cadeirões forrados a azul e do sol que entrava, enviezado como um ponto pé-de-flor, pela janela. Lembro-me de olhar, extasiada para as maravilhas em que se tornavam aqueles linhos brancos, depois do toque mágico das mãos da minha avó, das minhas tias e da minha mãe. Que tardes essas... E lembro-me da paciência que tinham essas matriarcas, cada uma com o seu estilo próprio, a ensinar-me milagres no desjeito das minhas mãos, então pequeninas e impacientes demais para os rigores tranquilos de uma agulha, de um bastidor... E, fatalmente, rotineiramente, picava-me, apesar do dedal e da amorosa atenção que me dedicavam, creio que pelo gosto de ver brotar aquele orvalho encarnado na ponta de um dedo e ficar na expectativa da profecia, que é como quem diz de ouvir a lenga-lenga da adivinhação: gosto, desgosto, carta, encontro ou casamento - dependendo do dedo picado, está bom de ver! Hoje, de repente, tive muitas saudades dessas tardes, das picadas, das lenga-lengas e desse sol que entrava enviezado pela janela com mimos de mãe para todas nós. Até loch...