20070310

Pele de papel pardo

Há qualquer coisa que incomoda. Não, não é só cansaço. Não são só as dores no ossos, a neurodermite, a taquicardia. Há qualquer coisa que incomoda. Ume espécie de pele que não devia estar onde está e se sente opressiva, asfixiante, cheia de poder, apesar da ausência de direito natural do seu surgimento. Uma espécie de redoma criada do exterior, em material tosco, primário e, queira Deus, tão efémero quanto a consciência da sua momentânea existência. Mas incomoda como um sapato que aperta, como uma luva grosseira que inibe a sensação e até o gesto. Interessa-me fazer de conta que consigo despi-la assim, com a mesma indiferença com que se tira uma pulseira que começa a pesar no pulso. Não é, no entanto, assim tão fácil. Ligo a televisão com a displicência das rotinas. O canal é o tal dito público e apanho nos ouvidos com uma coisa que não consigo entender. É natural. Vai havendo cada vez mais coisas que não consigo entender e dá-me uma pena infinda a pobre, a miserável ficção que oiço e que, em relances, vejo. Parece um pesadelo de casebre. Como quase tudo o mais. Não é mais do que uma pele de papel pardo e, no entanto, está aqui. Ninguém me mandou ficar com um pé na terra e outro no loch... erro meu!