No agoiro do 11 de Fevereiro....
Ah estou farta de tanto circo!
Até loch.
- quantos séculos nos contemplam? -
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe uma eleição, a clamar voto
quem sabe o referendo (sim ou não)
Eu possa dizer deste amor devoto:
Que siga atento até na decepção
e que seja infinito enquanto dure.
Até loch...
Quem não conhece esta imagem, exemplo típico do mosaico bizantino? De facto, acho que não há quem não conheça... e no entanto, a arte deste mosaico bizantino está na colagem de tantos, de tão inúmeros pedacinhos que, se calhar, poderiam ser colados de outro modo, dependendo da emoção do autor, do seu sentimento, da sua visão da realidade... da sua própria apetência para o acto de os reunir, das névoas ou sóis que lhe acudam aos olhos no momento de decidir o que retratar... E depois falamos do ser humano como um conjunto, também ele, de pedaços, sem vasos comunicantes, em que a emoção estará de um lado e a lógica do raciocínio do outro... De acordo com isto, eu sou um armário de gavetas e, incorrectamente porventura, não me sinto como tal... Não sou um armário de gavetas, sou um conjunto, possivelmente governado por dois hemisférios cerebrais que fazem a sua síntese naquilo que eu sei que sou e naquilo que os outros crêem que eu sou... E de repente há quem crie hierarquias quanto à posição destes hemisférios e hierarquias quanto a tudo - tudo - aquilo que faz o meu eu...
Soleil du Dimanche, Mucha
Foto: Obrigado M.
Abeiro-me do loch com uma chávena de café acabadinho de fazer. Ataranto-me na pressa do despertar, do sair da noite urbana, tão raramente estrelada, que o ruído ensurdece-me e emudece o céu. Apetece-me o loch, o vale, o intervalo entre os pontos, o imenso interstício das galáxias ruidosas e fulgurantes onde de vez em quando encontro o silêncio e deleito-me na visão dos rastros que continuam a ser luz e que até podem guiar, apesar de já só existirem para os olhos, a distâncias de tempos, de espaços, de matérias que já deixaram de o ser. Olho para o céu, nesses silêncios, e vejo as lamparinas acesas por pavios e óleos lentamente consumidos em antanhos de que não há sequer memória. Só há luz.
Novo ano, vida nova, casas novas e até mudanças de casa (como é com o Ideias Soltas) e eu com expectativas de outras coisas novas, como, por exemplo, um serviço noticioso na RTP1 num formato e com um tratamento de conteúdos mais interessantes. Mas não. Está tudo na mesma, exactíssimamente na mesma, com directos e longas reportagens (nem que seja para confirmar que não há notícia) sobre temas que, na minha opinião, não o justificam, pelo menos naquilo que se espera de um 'noticiário'. Se calhar, era preciso haver outros programas noticiosos onde dar vazão a tanta reportagem e entrevista à prima do vizinho que vivia em frente do cunhado do avô do vogal da associação cultural que era suposto ter servido o tal porto ferreira que, afinal, ninguém tinha pedido... Será normal? Se calhar, é, porque isto anda assim há muitoooooooooooo tempo. E, se calhar, também, sou eu que estou cada vez com menos pachorra para levar com o auto-colante de espectadora estúpida e ignorante... Até loch!
Começar assim, com o pé direito, que é como quem diz 'com o olhar certo' - se é que há olhares certos! - mas começar assim... sem muros a entrincheirar ideias, sem redes a boicotar a alma, sem 'mas' a atordoarem uma genuína vontade de estar-se bem, por dentro, por fora, a sós, com outros, sem paredes a fazerem de pálpebras... Até loch.